outubro 14, 2005

ÁLBUM DE FAMÍLIA


As fotos de família são objetos de culto. Com o tempo vão tornando-se relíquias. Philippe Dubois fala dos aspectos da fotografia que faz com que ela tenha esse valor sentimental, que segundo ele, vai além de qualquer racionalidade. Definitivamente, o que confere valor a essas fotos de famílias não são as qualidades estéticas da composição ou, o grau de semelhança ou de realismo, mas sua conexão com a realidade. As fotos trazem os traços físicos de pessoas singulares que estiveram ali, e que têm relações particulares com aqueles que as olham.
A fotografia é inseparável de sua situação referencial. Ou seja, encontra seu sentido, em primeiro lugar, em sua referência. Por este motivo seu valor vai alem da sua qualidade estética.

[...] A foto, literalmente, como objeto parcial (no sentido freudiano), oscilando entre a relíquia e o fetiche, levando a "Revelação" até o milagre. Num modo mais trivial, toda a prática do álbum de família vai no mesmo sentido: além das poses congeladas, dos estereótipos, dos clichês, dos códigos fora de moda, além dos rituais de organização cronológica e da inevitável escansão dos eventos familiares (nascimento, batismo, comunhão, casamento, férias etc.), o álbum de família não cessa de ser um objeto de veneração, cuidado, cultivado, conservado como uma múmia, guardado numa caixinha (com os primeiros dentes de bebê, ou com a mecha de cabelos da vovó!); só se o abre com emoção, numa espécie de cerimonial vagamente religioso, como se se tratasse de convocar os espíritos [...] (Philippe Dubois).

[...] Essas sombras cinza ou sépia, fantasmáticas, quase ilegíveis, não são mais os retratos tradicionais de família, são a presença perturbadora de vidas detidas em sua duração, libertadas de seu destino, não pelos prestígios da arte, mas pela virtude de uma mecânica impassível; a fotografia não cria, como a arte, a eternidade, não embalsama o tempo, apenas o subtrai de sua própria corrupção; [...] a fotografia beneficia-se de uma transferência de realidade da coisa para sua reprodução. O desenho mais fiel pode dar-nos mais informações sobre o modelo, mas jamais possuirá, apesar de nosso espírito crítico, o poder irracional da fotografia que domina nossa crença. [...] (André Bazin)

[...] Como impressão luminosa, a foto é a 'presença íntima de algo de uma pessoa, de um lugar, de um objeto. Ao mesmo tempo, dá a caução mais forte do uma-vez-nunca-mais. Data impiedosamente os seres que são para nós os mais vivos, mas fora de qualquer duração. Ela os coloca num espaço estritamente localizável, mas fora dos verdadeiros lugares. Cada um nela não passa de uma fração de instante e um corte de espaço que não podemos viver nem reviver.[...] (Henri Van Lier)

Estas citações estão no livro Ato Fotográfico de Philippe Dubois Editora Papirus.
links:
degrau_final.pdf